Arranjo feito com poda de jardineiro que me deixou recolher o que ia para o lixo |
Naquela tarde, uma vez mais, cheguei em casa carregada de sacolas. Talvez se eu fosse um polvo desse conta das muitas coisas que tenho carregado nessa vida. Mas não sou e nessa encarnação creio que nunca serei.
Mas cheguei ao prédio e me coloquei a descarregar tudo aquilo que trazia.
E no hall, me observando, uma moça de longos cabelos negros. No colo, a simpatia em forma de bebê: um menino dos seus sete meses, sorridente apesar da chupeta que equilibrava na boca. Ao lado, um banquinho de piano.
Como o dia tinha sido de calor absurdo, creio que a jovem mãe levou a criança apenas de fralda descartável.
No entanto, e como é bem comum nesses dias calorentos, o fim da tarde trouxe chuva e um vento gelado.
Tentando proteger o bebê, a mãe lhe amarrou às costas uma fralda de tecido (provavelmente a fralda de boca).
Dessa forma, ele parecia um super bebê com essa capa de fralda.
Ao lado, quieto como lhe convinha, o banquinho de piano esperava.
Quando chego ao meu andar, me deparo com cerca de cinco homens e um piano barrando a porta do elevador.
Ora, o piano claramente não cabia no elevador e estudavam agora sua descida pelas escadas.
Todos estavam excitados e suados pela missão.
A moça lá embaixo. O super bebê ao colo. O banquinho impaciente. O piano aqui em cima, deixando seu lar de muitos, mas muito anos mesmo.
A pianista morrera há tempos e seu silêncio gritava pelo apartamento. O banquinho vazio, as teclas inertes, a quietude atordoante.
Agora a moça o teria e o super bebê poderia ouvi-la tocar.
Esse mesmo piano também tinha embalado outro bebê, agora um homem de cerca de cinquenta anos que acompanhava a confusão criada porque decidira se desfazer do piano.
E sua falecida mãe também havia sido, um dia, uma moça pianista, como a moça que esperava no hall.
E também se excitara com a chegada desse mesmíssimo instrumento.
Por isso, eu chego carregada de sacolas, suada e alegre por ter uma moça, um bebê e um banquinho de piano no hall, me observando nessa encarnação onde só tenho duas mãos.
8 comentários:
Oi querida Rebeca!
Nem preciso dizer mais, mas para garantir, quero que saiba que amo suas postagens, amo a doçura com a qual narra os seus dias, cheios de flores e pessoas que de alguma forma fazem uma importante passagem pela sua vida, nesta encarnação, onde tem apenas dois braços... rsrs
Ri alto, imaginando você com seus tentáculos, cheios de sacolas... rsrs
Simplesmente amei.
Beijos e até breve.
Hola Rebeca querida !! Me es muy difícil comprender el portugués .. Que tenga un lindo día
Oi Rebeca, que lindo conto... cheio de novas esperanças...
É bacana ler um conto que imaginamos toda a cena...
Eu fiquei triste quando vi que estavam se desfazendo de um piano de alguém que se foi e um dia como você disse, foi uma moça pianista. Mas logo me alegrei quando vi que esse piano iria encher a vida de alguém, ou mais pessoas... do bebê com certeza.. esse super bebê que quem sabe um dia, embalado pelo som encantador do piano, poderá afinar sua sensibilidade e esticar seus dedos nas teclas pesadas e envolventes desse piano... Tomara!
Beijos meu e da Maria ♥
Olá Rebeca, que bonito conto, não sei se já lhe perguntei alguma vez, mas vc já pensou em reunir suas histórias numa coletânea? são contos lindos, curtos, tão cheios de sensibilidade e com um tipo de escrita muito próprio. Encantadores, de fácil leitura mas que convidam à reflexão. Me pergunto se saem totalmente da sua imaginação ou têm uma base de realidade. Acredito nesta última hipótese. Enfim, falando do conto propriamente dito, é o seguinte: tudo tem sempre um final, mas também um recomeço. A vida é feita de ciclos e o piano apenas mudou de mãos, literalmente, pois o desvelo de quem o toca será certamente o mesmo. Tristeza ou fim de linha para uns, recomeço numa família nova. Beijo!
PS: a foto está igualmente linda, já conhecia do IG mas adorei rever. As sobras de uns são vida e beleza para outros. Pontos de vista, que bom que a humanidade é assim, cheia de nuances!
Olá Rebeca,
Amei o conto, como gosto de tudo que escreve, já tinha passado e lido, mas como o tempo naquele momento era curto deixei para comentar hoje. Ótimo tema para esta época do ano: recomeço, mudança e a felicidade de viver, pois é feliz que imagino que viva esta moça, mesmo só tendo duas mãos. Que o novo ano seja cheio de coisas boas!
Beijinhos
Olá Rebeca. Estou afastada do blog por conta de tanto trabalho (graças a Deus), mas hoje não sei porque, acho que saudades mesmo, resolvi abrir a página para matar um pouquinho dessa saudade e me deparo com esse conto tão lindo escrito por uma pessoa tão sensível. Endosso as palavras da Val que escreve sempre tão bem e é sempre tão observadora!Lembro bem do primeiro dia que vim aqui e me encantei com a historia de uma caneca...
Reúna sim seus contos e faça um livro! Vou ser a segunda a comprar, pq a primeira com certeza será a Val!Logo estarei de volta com mais frequência por aqui, enquanto isso o Instagram me salva! rsrs
O vaso, sem comentários!! Lindo!!
Um beijo
Estes textos são sempre uma surpresa tão agradável Rebeca!
Gostei muito do que escreveu! Existem momentos assim que nos deixam felizes só porque sim de facto.
E essa história vista pelos seus olhos é muito bonita!
Boa tarde, colega Rebeca!
Que belo texto, repleto de sentimento.
Ei, moça!
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Ficarei feliz com tua visita e comentário, sempre tão gentis.
Tenha uma linda nova semana.
Abração pra você! :)
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