Augusto. Gustão.
Tem a pele muito branca, os olhos muito azuis.
A barba por fazer, o casaco surrado e um andar decidido. Parece mesmo saber por onde vai, mas não sabe. Gustão enlouqueceu.
Antes, bem antes, era um jovem boa praça, bonito e disputado pelas mulheres.
Gustão era esportista, jogava bola e tinha muitos amigos.
E era, como eu, funcionário público.
A vida lhe corria tranquila e o destino parecia lhe acenar com metas já definidas: um dia, se casaria com uma das mulheres que ele mesmo poderia escolher, teria filhos e quem sabe um cão. Ou um passarinho, ou um bicho qualquer.
Uma casa para onde voltar todos os dias após o expediente, uma mulher para acariciar e amar.
Uma janta para jantar, um lar para sustentar. Uma parede para furar, uns quadros para pendurar, um quintal para varrer. Uma família para chamar de sua.
E nessa altura da vida, onde éramos todos jovens e cheios de planos, houve um intervalo.
Anos sem nos vermos, sem nos encontrarmos. Apesar de trabalharmos na mesma Prefeitura, são muitos prédios e muitas distâncias a separar os funcionários.
Um dia, Gustão reaparece mudado. Magro demais, barbudo demais, etéreo demais.
A cabeça parecendo uma nuvem, inalcançável.
As frases são curtas. Pede um cigarro e vai-se embora. Mas deu de voltar sempre, quase que diariamente, pedindo sempre mais cigarros.
Entendemos tudo: Gustão enlouqueceu. Perdeu a noção, surtou.
Conserva algumas recordações: jogava bola com o Fernando, nosso amigo.
Mora com a Gracinha, sua irmã. Tem que voltar para casa ao meio-dia.
Toma remédios. Fuma. Gosta de sentar na praça.
E bebe o café que lhe oferecemos como se fosse o último do mundo: o líquido precioso acabou e lhe ofereceram o último gole. Segura o copo plástico com as duas mãos, bebe devagar e concentrado.
E quando acaba, vira as costas e parte. Como se soubesse para onde vai, como se tivesse uma mulher a lhe esperar, uma casa para arrumar, uns quadros para pendurar.